Wôlmer Ezequiel

O comandante do 14º BPM afirma que o Centro em Açucena vai amenizar a falta de vagas
IPATINGA – Frequentemente, a violência praticada por adolescentes é estampada nas páginas policiais de veículos de comunicação. Do outro lado, a sociedade se mostra cada vez mais indignada com a “impunidade” dos autores que recebem tratamento legal diferenciado por estarem com idade abaixo da maioridade penal, de 18 anos. A condução dos casos baseia-se no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que prevê uma série de medidas socioeducativas para adolescentes infratores.
Em casos de atos infracionais graves ou gravíssimos, a medida extrema a ser adota é a internação em Centro de Internação de Adolescentes (CIA). Em caráter provisório, ela pode ocorrer em até 45 dias. Após o julgamento, o adolescente pode permanecer internado por até três anos. Porém, devido ao déficit de vagas no sistema, os órgãos de segurança pública e da Justiça se veem impedidos de encaminhar esses infratores para internação e eles voltam para as ruas. Entretanto, esse quadro tem mudado. Do mês de abril até a sexta-feira (10), onze adolescentes infratores de Ipatinga foram encaminhados para vagas em centros localizados em diversas cidades de Minas Gerais, como resultado do esforço conjunto das polícias Civil e Militar, Ministério Público e Judiciário.
O comandante do 14º Batalhão de Polícia Militar, tenente-coronel Edvânio Carneiro, disse que, apesar de provisória, a internação é ideal. “É adequada, haja vista que a presença dos infratores na sociedade é um risco. Em alguns casos, os menores têm a própria integridade física ameaçada, pelo fato de estarem em convívio social”, declarou o comandante.
Vitória
Em relação ao trabalho conjunto para a internação dos onze adolescentes (até à tarde de sexta-feira, 10) o tenente-coronel Edvânio Carneiro, informou que os infratores foram encaminhados para centros em Governador Valadares, Teófilo Otoni, Sete Lagoas e Divinópolis, uma vitória, face à dificuldade de conseguir vagas. “Queremos acabar com o senso comum de que nunca nada acontecerá com eles. Isso está previsto na lei. A grande questão é o número de vagas disponíveis para essa internação. Essa é a resposta para sociedade e para os que estão na prática de atos infracionais, de que alguma coisa vai acontecer”, afirmou.
A inauguração do CIA, em Açucena, que deve oferecer cerca de 30 vagas para adolescentes, gera expectativas também entre as autoridades. No momento, é feita a seleção de funcionários para atuar na unidade. Para o tenente-coronel Edvânio Carneiro, o Centro vai melhorar a situação de falta de vagas. “O CIA de Açucena vai ajudar. Os órgãos de defesa social estão atentos para que ocorra a redução de atos infracionais praticados por adolescentes. No Vale do Aço, o número dessas infrações é grande e, infelizmente, crescente. Mas precisamos sepultar de uma vez por todas esse senso comum de que não vai acontecer uma resposta”, frisou o comandante.
Edvânio Carneiro defende a aplicação de outras medidas socioeducativas previstas no ECA. “Não existe só internação, outras medidas de meio aberto podem ser aplicadas para evitar que a situação piore. Defendo que, para situações graves, a internação é o melhor remédio. Ela serve como freio para que os adolescentes infratores saibam que haverá punição”, disse.
Wôlmer Ezequiel

Irene Franco explicou as etapas do processo que antecede à internação
EngrenagemA titular da 1ª Delegacia de Polícia Civil de Ipatinga, Irene Franco, que atuou na Delegacia de Menores por dez anos, destacou a importância da atuação conjunta dos órgãos de segurança e Judiciário no esforço para conseguir as disputadas vagas para internação. “Os organismos que estão em torno da questão têm que andar em conjunto. Sem isso eles acabam perdendo força. É como se fosse uma engrenagem. Não adianta ficar só a cargo do Judiciário. É preciso a união de forças para batalhar essas vagas junto à Seds (Secretaria de Estado de Defesa Social) para internar os adolescentes. E isso tem ocorrido”, falou a delegada.
Procedimento
A delegada Irene franco detalhou o processo que vai da apreensão do menor infrator até a sua internação. Depois da apreensão em flagrante, ele é levado à delegacia, onde é feito o auto de apreensão, cercado de formalidades. O pedido é levado ao Ministério Público. “O delegado não pode pedir a internação, ele sugere à promotoria a internação. A decisão se vai internar ou aplicar outra medida socioeducativa é da promotoria. No caso da internação, depois de determinada a medida, é encaminhada ao juiz. O magistrado vai dar a decisão antecipada, se for o caso, que permite internação provisória até 45 dias”, detalhou Irene Franco.
É neste momento que entra em cena o esforço das autoridades para conseguir a vaga. “Se tivéssemos o nosso CIA, o juiz determinava a internação e mandava recolher. Hoje, mesmo com a ordem judicial, por falta de vaga, o adolescente é colocado em recolhimento domiciliar. Mas não há fiscalização disso, aí o menor fica solto. Embora não tenhamos CIA, os órgãos não estão de braços cruzados. Se não interna, é porque não tem vaga mesmo”, completou Irene Franco.
Açucena
Em relação ao CIA de Açucena, Irene Franco acredita que as vagas vão atender à demanda local. “A minha visão como delegada é que o Centro em Açucena é suficiente em princípio para atender à região. Acredito que, quando começarem as internações provisórias, haverá diminuição dos atos infracionais. A sensação de impunidade e dificuldade de vagas acaba gerando no menor de idade a coragem para se dedicar ao conflito com a lei”, opinou.
A delegada alerta que a internação é solicitada somente em casos graves ou gravíssimos. “Essa segregação, ainda que provisória, é exceção, não é regra. Nem todos serão internados. O ECA tem outras medidas que devem ser cumpridas”, reforçou.
“População vive amedrontada e indignada”, reconhece juiz
O juiz da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Ipatinga, Mauro Simonassi, que acatou o pedido de internação dos onze adolescentes, reafirma o problema da falta de vagas e de um CIA em Ipatinga. “O maior problema hoje á a falta de vagas para internação dos menores. Nosso grande problema é a construção de um CIA em Ipatinga, apesar da unidade provisória em Açucena. Isso não resolve, mas ameniza bem, já que população vive amedrontada e indignada com essa situação. E com razão, pois ela vê as coisas acontecerem, quer providência e nós estamos limitados pela lei. Não tem local para internação provisória. Além de juiz, sou membro da sociedade e estou preocupado com ela”, salientou o magistrado.
Mauro Simonassi também destaca que a internação é feita em casos extremos, apenas. “A priorização de vagas é de casos gravíssimos, em função do número disponível. Temos decretado a internação provisória dentro da lei. Um número significativo de decisões aguarda vaga para internação. As internações que conseguimos recentemente são fruto de uma ação conjunta, mas é preciso muito mais vagas”, observou.
Wôlmer Ezequiel

O magistrado apóia a redução, mas discorda do argumento de que ela não resolverá a criminalidade
Divergências sem fim na proposta de reduzir a maioridade penal
Em função do cenário nacional de adolescentes envolvidos em ações violentas, são fortes os movimentos que pedem a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos de idade. Especialistas e autoridades divergem nas opiniões, mas são unânimes ao dizer que o mais importante é a aplicação da lei em sua totalidade. Desta forma, o atual Estatuto da Criança e do Adolescente já seria eficiente. Mudar a lei, sem criar mecanismos eficientes, não resolverá, por si só. É o que afirma a delegada regional Irene Franco: “Penso que só podemos querer mudar a lei quando ela é cumprida na sua integralidade. Temos um problema nacional, em que o ECA não é amplamente cumprido. Quem sabe, se ele fosse aplicado amplamente, com as medidas socioedutivas, isso não seria suficiente? O ECA é uma lei boa mas, infelizmente, não é cumprido em sua totalidade”.
A delegada defende uma mudança da lei no sentido de avaliar cada caso, independentemente da idade. “A mudança da lei deveria ser no sentido de avaliar o caso, para entender se o adolescente tem a compreensão da gravidade do fato. Se ele tem, recebe tratamento mais rigoroso. Para isso, precisaria ter uma estrutura. A simples redução é a solução mais rápida, mas não resolve em médio prazo. Temos até crianças praticando atos graves. Acho que, uma hora, a redução será aprovada, mas não fará muita diferença”, opinou.
Favorável
O juiz Mauro Simonassi se declarou favorável à redução da maioridade penal. Para ele, na era de acesso irrestrito à informação é preciso mudar. “Nesses tempos atuais de acesso à informação, o menor pode votar, ter acesso até a sites de conteúdo pornográfico, pois não há controle disso. A realidade de hoje é muito diferente do que era em tempos passados, do Código Penal de 1940. De dez anos para cá muita coisa mudou e isso não se justifica mais”, defendeu.
O magistrado destaca que, em função desse acesso à informação, o adolescente tem consciência dos seus atos. Mauro Simonassi aponta também como “fraco” o argumento de que a mudança resolverá a criminalidade. “Acho que a maioridade penal deve diminuir porque hoje o adolescente de 16 anos tem condições de entender esse comportamento e determinar-se de acordo com esse entendimento, devido ao seu acesso à informação de forma ampla, geral e irrestrita. Essa é a questão. O argumento de que a redução vai resolver o problema da criminalidade é fraco”, pontuou.